sexta-feira, 6 de maio de 2011

A FILOSOFIA E A ESCRITA




A FILOSOFIA E A ESCRITA:
A relação dos filósofos gregos com a escrita
Joás de Jesus Ribeiro ¹

Resumo:

A tradição transmitiu de forma subtendida que os gregos já eram letrados e doutos deste o seu inicio mais remoto, mas esqueceram de que eles viveram durante muito tempo assim como outros povos que os cercaram debaixo do jugo atribuído pela tradição oral. Ate mesmo o grande poeta como Homero pode ter vivido esse período, que requisitava apenas uma boa memória para passar adiante as fabulosas e esplêndidas narrativas. Com o desenvolvimento da escrita os gregos conseguiram finalmente sofisticar o modo de preservação das tradições culturais . Foram essas praticas que contribuíram paras o surgimento dos filósofos, e que preservaram uma parte mínima do que restou de um povo que contribuiu para a formação daquilo que mais tarde seria chamado de humanismo no ocidente. Logo os textos deixados foram utilizados pelos povos conquistados, mas que também foram conquistados e seduzidos pelo logos  grego, os romanos instituíram em suas raízes latinas o clássico grego , os bárbaros constroem a idade media com boa parte da tradição Greco-romana e os renascentistas dão vida ao antigo pensamento pagão , na modernidade  surgiram pensadores  que dialogaram com essas tradições , a revolução da escrita na Grécia trouxe grandes contribuições no mundo Ocidental.
Palavras chaves: memória, narrativas , escrita, tradições , ocidente.
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1 Introdução:

Os sumérios são um s dos povos que desenvolveram a escrita, na região da fenícia surgiu um sistema de escrita que deu origem aquilo que seria chamado pelos gregos de alfabeto. Logo o conhecimento desse sistema de escrita proporcionaria a perpetuação de mythos (narrativas) para as próximas gerações sem que precisa-se ser por via oral, assim como postulados filosóficos que não se prendiam mais nas explicações das narrativas , mas procuravam por intermédio da physis compreender o Cosmos. Muitas obras acerca do mythos feita pelos poetas e da physis feita pelos filósofos se perderam , porem os fragmentos dão a idéia do esplendor que essas obras possuíam . foi esse repasse de tradições de pensamento de uma geração para outra que propiciou o “ dialogo” entre o pensamento aristotélico e o pré-socrático . Mas a grande discussão que ajuda a elucidar essas questões cerne aos pré-socráticos os quais estavam mais perto ainda da forte influencia dos mythos. A forma que Homero e Hesíodo compreenderam o Cosmo através das revelações entregues pelas musas tinha forca no pensamento grego, tais influencias acabaram interferindo no mudo de dizer dos pré-socráticos principalmente com aqueles  que buscavam um principio gerador do Universo , diferente das cosmogonias a explicação  de mundo apresentada por eles possuía um logos mais sofisticado e questionador . pode-se dizer que estava surgindo os primeiros métodos de analise do pensamento humano , é importante lembrar que esses pensadores não abandonaram de uma vez por todas os seus ritos e credos, já que é fácil identificar algo peculiar de suas tradições  presentes em suas obras , ate mesmo Sócrates e Platão ainda tinham forte a feições as narrativas mesmo discordando da postura dos poetas.
Porque, segundo julgo, diviamos que os poetas e prosadores proferirem os maiores erros acerca dos homens: que muitas pessoas injustas são felizes, e desgraçados as pessoas, e que é vantajoso cometer injustiças, se não forem descobertas, que a justiça é um bem nos outros, mas nocivo para o próprio. Tais opiniões, dir-lhes-íamos que se abstivessem delas, e prescrever-lhas-íamos que contassem a narrativa o contrário. Não achas?
(Platão, livro III; 392 a – e)
2 Os escritos perdidos:

Não há um desprezo as narrativas, como muitos tendem a considerar, mas uma proposta para uma nova visão do mundo na concepção grega. Para Platão esse mundo deveria está pautado na justiça e verdade, fundamentados na idéia de Bem. Os pré-socráticos possuíam também uma visão diferente das narrativas de suas culturas, por exemplo, Tales de Mileto considerava água como o principio do Cosmos, para ele a physis vinha dessa substancia que é essencial para a vida e a existência do mundo. Pitágoras não se prendia mais as teogonias e cosmologias egípcias , ele por sua vez compreende o mundo através dos números que segundo ele era o principio do mundo. Elementos da physis tomam a cena no período de investigação e especulação dos pré-socráticos ou filósofos da physis. Cada doutrina ou corrente filosófica precisava da discípulos para perpetuarem os seus pensamentos  a escrita teve um papel importante durante o desenvolvimento desse novo método de pensar que se distinguia da visão mítica do mundo. Boa parte o que escreveram os filósofos da physis se perderam no decorre do tempo, muito pouco se sabe do que eles pensavam e escreveram os fragmentos e comentários feitos por pensadores posteriores ajudaram a preserva o pouco que restou. O próprio Aristóteles comenta alguns desses pensadores, o que se sabe hoje é apenas perspectivas da visão dos filósofos depois de Sócrates isso deixa uma incógnita muito grande sobre o modo de pensar dos pré-socráticos.
3 O logos grego e o desenvolvimento da escrita:

(...) O que era lógico para Homero o era igualmente par a Aristóteles (...). Em suma, língua tinha uma lógica comum, que finalmente foi formalizada por Aristóteles. A melhor ilustração de como este pressuposto funcionava era visível no próprio dicionário de grego (...)
(Havelock,Eric A.1996,235)

Diferente do que se adquiriu como problemas criados por causa das traduções, os gregos possuíam a nítida compreensão daquilo que os poetas e filósofos falavam, logo eles estavam basicamente inseridos na mesma cultura e língua, isso facilitava o entendimento entre Aristóteles e Homero, por exemplo, entre Sócrates  e um simples ateniense cidadão da polis . A língua era a grande ferramenta que proporcionava o “dialogo” de obras fossem elas poéticas ou filosóficas. Esse era o cenário existente na Grécia antes da conquista de Alexandre, que após sua invasão a dissolução das polis trouxe transformações na forma de pensar grega. O governo de Alexandre era cosmopolita , ele não considerava outros povos como bárbaros ao contrario do seu mestre Aristóteles. Nesse governo a cultura grega foi disseminada nas nações  conquistadas no oriente , então  surgi um dialeto da língua grega resultado desse conquista , era o grego koiné. Boa parte dos manuscritos encontrados hoje estão nesse grego e possuem a datação desse período. Será que houve mudanças com essa nova concepção de cultura grega ? Pode-se considera que sim, logo porque os povos conquistados também provocaram certas influencias no Ocidente.
(..) Se a língua é um espelho de pensamento , e se a semântica da língua consiste de um  sistema de partes intercambiáveis, então o pensamento dos gregos constitui um sistema similar.
(Havelock,Eric A.1996,235)

Porém a cultura grega foi disseminada no oriente graças aos escritos, que transpassaram o pensamento de uma nação dominante sobre as conquistadas, a Palestina e o Egito são exemplos desse acontecimento. Tais povos que tinham como idioma o hebraico, aramaico, copta e a língua do antigo Egito passaram a ser obrigados a negociar na nova língua comercial, o grego , logo não tardou muito e vários manuscritos religiosos, comerciais e administrativos passaram a ser comuns na região. É nesse período que as escolas socráticas menores espalharam os pensamentos dos filósofos gregos dentre essas colônias, causando um certo impacto cultural nesses povos “bárbaros”. Foi esse acontecimento que deu êxito para a filosofia que pode se considerada um produto da cultura no Ocidente.
 A forca dessa língua foi tão grande a ponto de deixar influencias nos adeptos de uma seita judaica que estava nascendo, a qual mais tarde seria o cristianismo, o apóstolo Paulo de Tarso é um exemplo disto. Seu comportamento lembra muito os epicuristas, na forma de repasse de seus pensamentos através de viagens missionárias coisa que os epicuristas tinham, assim como a organização sistemática da idéia de bem e verdade na figura de Cristo. Usando uma “lógica” os cristãos aprenderam a organizar suas doutrinas religiosas utilizando um pouco da tradição grega para a fundamentação da nova Fé baseado em um Reino supra terreno similar ao mundo das Idéias perfeitas de Platão.
A escrita possibilita o desenvolvimento do raciocínio lógico. O qual poderiam ser apresentados com facilidade nos manuscritos, então a preservação destes textos estava garantida para as próximas gerações. Apesar que o repasse da tradição e a formação do grego dependesse ainda da oralidade a filosofia começou a possuir seu primeiro acervo. Outro grupo que também se empossou da escrita foram os poetas, é importante lembrar que eles tinham as revelações divinas e que em épocas remotas na Grécia era usada apenas a tradição oral. Há uma diferença entre os poetas e escritores, ser um poeta grego não significava necessariamente que se fosse um escritor. Obviamente com o passar dos séculos esse grupo acabou utilizando a escrita.
Foi com Aristóteles que o raciocínio lógico ganhou uma “formatização”, muitos enunciados lógicos foram feitos pelo filósofo, o silogismo é o grande representante da lógica aristotélica que diferente das narrativas poéticas, não se prendia mais em algo que dependesse da beleza ou tragédia para ser representado. Mas uma linguagem que pudesse ser entendida através da analise do logos. Pode-se considerar que esse período é o auge do desenvolvimento da escrita na Grécia. Aristóteles escreveu em grego e para os gregos, ele não tinha nenhuma preocupação em repassar seu enunciado para outros povos. Porque ele supervalorizava a sua nação, não considerando a capacidade de raciocínio das outras nações que segundo ele viviam em estado de barbárie e não se preocupavam com a busca pela sabedoria.
4 A relação dos filósofos com a escrita:

Qual foi a relação dos filósofos gregos com a escrita? Seriam eles grandes escritores? Sócrates o grande representante da filosofia nada escreveu até mesmo Homero, o poeta, pode não ter escrito nada, isso traz a antiga discussão acerca da existência desses homens, mas o que se tem de prova sobre o relacionamento dos filósofos e a escrita é aquilo que chegou ate hoje. Em algumas escolas socráticas menores se preservou a forma de expressar os pensamentos pela oralidade, por isso muita doutrinas filosóficas dessas escolas se perderam. Alguns acreditavam que havia reflexões que não podiam ser expressa simplesmente em um papiro, devido a sua grandiosidade, muitas reflexões filosóficas adquiridas na academia fundada por Platão se perderam porque jamais foram postuladas pela escrita.
Então observa-se que nem sempre as reflexões filosóficas dependeram da escrita para serem repassados, mas isso não significa que os primórdios da filosofia era não letrados, a interpretação correta é que existia um esoterismo peculiar a cada corrente, o sentido de esoterismo remete a restrição de “idéias peculiares” a determinado grupo, ou seja, os epicuristas possuíam enunciados que só eles tinham acesso pela oralidade. Porém no Fedro já se encontra elementos que demonstram o espaço que a escrita estava conquistando na educação dos jovens e ensino dos discípulos, Sócrates por sua vez analisa os postulados escritos de um sofista, logo trata-se de uma analise filosófica sobre uma obra.
(...)de fato, nem a de nossa língua, nem qualquer sintaxe moderna, pode dar conta da condensação original.
(Havelock,Eric A.1996,252)
Considerações Finais:

Só um grego que viveu naquele contexto pode ser considerado aquele que teve acesso as interpretações originais. Muitos do que se diz hoje está “corrompido” pelo nosso próprio contexto e visão de mundo. Mas isso não impossibilita uma analise hermenêutica e filosófica dessas obras produzidas, porém é importante a consciência das limitações encontradas por causa das grandes lacunas deixadas na antiga tradição, seria correto afirmar que pouco se conhece sobre a interpretação original.
As traduções e interpretações das obras filosóficas gregas são um desafio para uma tradição pós-moderna. Há vários comentadores que buscam elucidar lacunas deixadas durante a história do ocidente. Foi a escrita na Grécia a contribuidora da filosofia o que possibilitou uma hermenêutica que deste os medievais aos pós-modernos vem se preocupando com questões que cerne uma interpretação mais próxima possível da original. Quando Avicena e Averrois dedicam seus estudos para uma lógica aristotélica observa-se uma atenção mais minuciosa dos textos. Os comentários feitos por eles trouxeram transformações no modo de pensar do Ocidente que até então não tinha o acesso a essas obras preservadas no Oriente. Trata-se de uma analise profunda de escritos que sobreviveram durante anos de esquecimento, mas que depois suas aparições revigoraram o renascimento de uma tradição que possuía elementos perdidos. Desde o momento que os gregos tiveram acesso a algo criado pelos sumérios e formatado pelos fenícios, houve grande transformação na cultura grega que deixou de ser composta por simples colônias de pastores e pescadores para ser o berço da valorização da Razão. Por isso o pensamento tácito de que a Grécia é o que é na tradição por causa do seu alto nível cultural. Não esquecendo que havia um período que a escrita não existia, só depois se passou a documentar uma parcela do modo de viver e pensar do grego.





















Bibliografia:

Havelock Eric A. a revolução da escrita na Grécia e suas conseqüências culturais; tradução: Ordep Jose Serra, editora UNESP – São Paulo/ Paz e Terra- Rio de Janeiro, 1996.

Platão, República, tradução: Pietro Nassetti, editora Martin Claret – São Paulo, 2009.

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